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quarta-feira, 28 de novembro de 2007

O exemplo vem de cima?


O "Livro Negro" que o responsável pelo I.G.A.I. abriu no Expresso e nas declarações a canais televisivos foi mais uma acha para a fogueira onde se vão consumindo as estruturas deste país.
Se provocou fundadas preocupações em altos dignitários do espectro político e da Sociedade, deixou boquiaberto e baralhado o mais comum dos cidadãos.
Não é caso de pequena monta que um alto responsável, das principais peças da nossa Segurança, venha a público diabolizar as forças com a responsabilidade da manutenção da ordem e da paz neste pequeno espaço europeu!
Apodar estas instituições de incompetentes, arrogantes, cow-boys, inimigos do povo, e outras estonteantes "meiguices", e delas fazer alarde na praça pública, não é acto gratuito ou um banal e legítimo manifesto de opinião.
Sem pretender contrariar, no seu todo, a substância das acusações que nos foram dadas a conhecer, de sua responsabilidade, concordando, em consciência, com algumas e discordando, em absoluto, de outras, não posso aceitar a forma e o lugar em que elas foram proferidas. Pelos nefastos efeitos que elas possam produzir, quer nas instituições visadas, já, por outros factores, tão abaladas, quer nos cidadãos que se vêm confrontando, em cada dia, com a sua segurança ou falta dela.
Sabemos que tanto a PSP como a GNR são estruturas hierarquizadas, numa pirâmide que tem por base o agente ou soldado e no topo o Ministro da Administração Interna, que, por sua vez, superintende no I.G.A.I..
Não pode, sem se confrontar com graves sanções internas, qualquer elemento da estrutura intermédia de qualquer uma daquelas organizações, vir a público, sem que superiormente autorizado, tecer comentários sobre a actuação ou organização interna. Não o permitem os próprios Regulamentos.
Vir o Inspector Geral, dependente do Ministro da tutela, à revelia(?) da entidade de quem depende, tecer acusações da índole das que foram profusamente propaladas, se por mais não fosse, seria um triste e condenável exemplo para todos os que, nessas estruturas de segurança, se submetem à hierarquia imposta.
Reside aí a minha estupefacção. Mais do que no conteúdo do "ataque" daquele responsável à PSP, à GNR e aos homens e mulheres que servem nessas instituições.
E, nesta perspectiva, é-nos legítimo, em nome do Direito, da transparência e, até, da honra das Instituições do Estado, que o Senhor Ministro da Administração Interna, esclareça se subscreve e autorizou as públicas declarações daquele Senhor.
Se o não fez, e ainda há uma réstia de dignidade no Poder que nos governa, só tem um caminho a seguir: ou demite o Inspector ou se demite. A bem das instituições e do Povo que é suposto elas servirem!

sábado, 24 de novembro de 2007

Não sejas camelo!



Temos arsénico nas Finanças, arsénio na Educação, arsénico na Saúde, arsénio na Justiça, arsénico nas Obras Públicas, arsénio no Ambiente....Somos governados por arsénios e arsénicos que nos asfixiam.
O que eu desconhecia, em absoluto, era que a água, uma das minhas fontes de vida, com eles convivia em excesso.
A água que bebemos e pagamos, nalguns concelhos do País está inquinada por ter uma quantidade reconhecidamente desmesurada daqueles nitrogenóides.
Também já sabia que o Município de Vila Franca de Xira, de que sou freguês e munícipe, me vende aquele bem essencial pelos mais altos preços do mercado.
Fiquei, agora, a saber que, para além daquele precioso líquido, venho custeando as elevadas quantidades do metal nele embebido, num execrável brinde armadilhado!
Por tudo isso, ninguém mais pretenda desvalorizar aquela máxima,

"NÃO SEJAS CAMELO!..."
e a que me sinto forçado a acrescentar:

"...NÃO BEBAS ÁGUA COM ARSÉNIO!"

Na Infopédia:
Arsénico:
QUÍMICA nome vulgar do hexóxido de arsénio(III), anteriormente chamado anidrido arsenioso, que é um composto branco extremamente tóxico e venenoso;
Arsénio:
QUÍMICA elemento químico com o número atómico 33, de símbolo As, de cor cinzenta e brilho metálico, que pode entrar na composição de certas ligas metálicas

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Táxi! Táxi!

Ontem, em fuga à chuva castigadora que ia caindo, apanhei um táxi junto à Praça do Chile.
Acomodado no banco traseiro, fui passeando o olhar pelos passeios molhados, enquanto o velho Mercedes ia rodando, vagarosamente.
Após receber um telefonema de um amigo e em que o tema da conversa girou à volta da aposentação, com referências à CGA, que a dita tardou e....bla´....blá...., o meu ocasional motorista soltou a língua e fez-me saber que também era funcionário público, condutor de veículos dos Correios. Que já havia feito umas horas, logo pela manhã, e que voltaria ao serviço mais para o fim da tarde. Foi-me explicando que anda há poucos meses com o táxi dum primo, fazendo umas horas extras. Que sempre eram mais uns cobres no final do mês e que necessitava mesmo de amealhar mais algum para fazer face a uma situação familiar complicada.
Não tenho por hábito comprar de barato estas estórias que qualquer desconhecido vai vendendo, sabendo todos das patranhas que se vão contando pelas esquinas de Lisboa.
A minha intuição, fruto de amadurados anos, e a forma veemente e sincera como o homem ia narrando os pormenores do seu problema, não me permitiram que a conectasse ao muro das falsas lamentações.
Aquele homem ia falando a verdade.
Que os cinquenta anos de idade ainda lhe não permitiam a reforma, que tinha duas netas ainda crianças e cujas fotos tive ocasião de ver estampadas no mostrador do seu relógio.
A neta mais velha, com seis anos de idade, padecia de doença grave e que este "biscate" de motorista lhe trazia alguns proventos para fazer face aos gastos da filha com as tentativas de lhe debelarem a leucemia que lhe fora detectada.
E lá foi gastando as palavras e os lamentos até ao fim da viagem.
Já no destino, não deixei de reflectir na situação daquela família, no problema da criança e, sobretudo, na genuína preocupação do taxista/carteiro que, não me foi difícil perceber, tem como meta e farol de vida, no imediato, resolver o problema da neta. Mesmo que tal implique hipotecar ao trabalho extra horas do seu merecido descanso.
E, simultaneamente, interrogar-me das razões que nos levam, humanos, a divergirmos tanto, nos conceitos e nas práticas de vida.
Enquanto homens, como este, se preocupam com a saúde, o futuro e o bem estar das suas crianças, outros urdem situações degradantes que as ferem e marcam para toda a vida. E se muitos dos primeiros são gente simples e anónima, já a maioria dos últimos são indivíduos "bem na vida", alardeando cultura e formação civilizacional, enquanto se comportam como monstros desumanizados. (Sabe-se do que estou a escrever...).
Que alguém me explique, me faça entender das razões de tanto paradoxo!

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Não podemos calar

Plágio em Moçambique


No "ForEverPemba" do nosso amigo Jaime Gabão, ficámos a saber de mais um plágio. Desta feita, em Moçambique, aquela terra mitica que não me canso de celebrar, por aqui e noutros ancoradouros virtuais.

Na verdade, sem que sejamos doutos nestas artes, ressalta à vista que a capa do segundo livro, ora lançado, tem motivos gráficos da do primeiro, editado em Setembro de 2007, da autoria do Prof. Dr. Rafael da Conceição.

É plágio!

Feio, indelicado e a exigir, no mínimo, um público pedido de desculpas.

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Moçãmedes

Moçãmedes (Vouzela/Viseu)

Moçamedes (Namibe)

A minha saudosa mãe, que era natural de Angola e donde regressou ainda criança, com a minha avó e irmãos, após o meu avô que era oficial do exército, ali falecer em combate numa denominada "Guerra da da Areia"(?), já me havia aflorado que não era mera coincidência o facto da aldeia de origem dos meus ancestrais (pelo ramo paterno) e uma jovem cidade angolana terem o mesmo topónimo. Já em 1977, o meu pai, que acabara de regressar de Moçambique e abrira um Café/Bar na aldeia, fez-me saber que fora contactado por um grupo de oriundos de Moçãmedes (Angola), que haviam manifestado a intenção de ali se juntarem num convívio/almoço.
Só então. movido pela curiosidade, decidi saber, em pormenor, das relações toponímicas de duas terras tão distantes.
E, ainda em finais dos anos setenta, escrevi o texto que vou reproduzir, apenas nas partes relevantes:


MOÇÃMEDES

Se por mais não fosse, ainda que passível de contestação, bastaria para justificar este "recordar origens", a introdução de Pinho Leal na sua obra "Portugal Antigo e Moderno", ao referir-se às vilas e aldeias deste país, em 1873: "Se estas são notáveis, por serem pátrias de homens célebres, por batalhas e outros factos importantes que neles tiveram lugar, por serem solares de famílias nobres ou por monumentos de qualquer natureza ali existentes".
Não está bem esclarecida a origem do topónimo Moçãmedes, mas estudiosos a quem o assunto mereceu atenção, convergem na sua raiz árabe. Há quem opine que Muçãmedes, como foi inicialmente designada aquela povoação, poderá derivar de "Muça-Medina" (cidade de Muça), facilmente convertível em Muçãmedes. Muçamudes eram, também, os habitantes de Muçaun. Outros defendem que Moçãmedes é o plural de "Masmuda", nome arabizado duma das muitas tribos que por lá passaram e habitaram.
Não raro, quando digo da minha naturalidade, vejo a dúvida estampada nos olhos dos meus interlocutores. Voa-lhes, numa inculpada ignorância, o pensamento para Angola, onde se situa, na costa sul, uma bela cidade do mesmo nome. Também neste caso a "filha cresceu mais do que a mãe"!
Foi um dos nobres senhores de Moçãmedes (14º), o 1º Barão de Moçãmedes, José de Almeida e Vasconcelos, ao tempo Governador de Angola, quem, em 1785, inspirou o padrinho da cidade africana. Padrinho que foi o Tenente-Coronel Pinheiro Furtado, quando, numa das suas explorações pela costa de Angola, fundeou na "Angra dos Negros" em 3 de Agosto daquele ano e que, em homenagem (bajulação?) ao Governador, baptizou o porto de mar onde se abrigara e que veria desabrochar, em 1840, a jovem cidade de Moçãmedes.
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Recuando à doação, o documento que legitimou a concessão de Moçãmedes a D. Fernão Pires, escrito pelo punho do próprio e, ainda, Infante D. Afonso Henriques, encontrava-se, há alguns anos, nos arquivos da Sé de Lamego.
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.... Depois de Gonçalo Pires de Almeida, de quem descenderam os Condes da Lapa, ramo dos "Almeida", família de nobres tradições na região de Viseu, a povoação (villa, como era conhecida naqueles tempos), manteve-se, desde 30 de Janeiro de 1410, na posse dos descendentes dos Almeida, até ao século XX........................................................................................................................
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in WIKIPEDIA:
Barão de Mossâmedes (ou barão de Moçâmedes) foi um título criado por carta de 13 de Agosto de 1779, da rainha D. Maria I, a favor de José de Almeida e Vasconcelos, um militar e governador-geral de Angola. O título deriva do Reguendo de Mossâmedes (na Beira), propriedade concedida aos seus antepassados em 1388. A cidade de Moçâmedes, actual Namibe, foi assim baptizada em homenagem ao 1.º barão, então governador-geral de Angola.

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Inquietações


Quem estiver minimamente atento ao ciclo que vivemos, não saberá como contornar as inquietações que nos vão assolando, em catadupa.
Inquieto-me, por exemplo, por saber que num momento de reconhecidas dificuldades económicas e em que nos são exigidos sacrifícios extremos, o Ministério da Justiça, haja entendido por bem não enjeitar exageradas mordomias e reforçar a sua frota automóvel com autênticas "bombas", de custos só acessíveis, neste emagrecido Portugal, a umas dezenas de bafejados pela sorte ou a padrinhos das máfias, já globalizadas.
E mais me inquietou a justificação do ministro da tutela ao "desculpar-se" com o facto de ter o aval do seu confrade das Finanças. Ficámos, assim, a saber que seria este o único obstáculo à aquisição das "bombas"; não a nossa calamitosa situação económica e social! Mais ainda, que, uma vez a concordância deste ministério que não nos perdoa nos impostos, o nosso ministro desertor, até se podia equipar, para seu conforto e dos seus correlegionários, com uma frota de aviões!
E é a problemática em torno do futuro pouso dos aviões outra das minhas inquietações: são, a terem crédito, as noticias de que, a todo o custo, seja qual for o rombo no nosso orçamento, o Governo faz finca pé na opção Ota, para o que já iniciou o processo de descredibilização dos estudos que apontam para Alcochete.
Não que a localização, enquanto tal, me incomode. Ota ou Alcochete, é-me indiferente.
Mas, sendo fiável, como parece ser, a conclusão de que esta última escolha nos pouparia muitos milhões e colheria vantagens de funcionalidade, inquietam-me as razões que estarão a pesar no prato Ota da balança.
Sabendo nós que esta opção havia sido, há vários anos, tomada pelo executivo(que não o actual), ainda que pouco haja extravasado dos corredores da Gomes Teixeira, seria alívio para esta inquietação saber, a bem da transparência e da confiança, quem são os proprietários que, após esse sinal daquele Governo, se apressaram a adquirir terrenos no proposto local da construção (Ota) e zona envolvente! Era um acto de Justiça.
Justiça que, esta sim, me inquieta bem mais, chega mesmo a assustar, pela propalada tentativa de tutela dos juízes e, por consequência, dos Tribunais, por parte do Executivo. Inquieto-me, e assusto-me, porque, após mais este passo, que mais ninguém se ufane de viver em democracia.
Já basta, e até será demasiado poder, a tutela absoluta governamental das policias de investigação criminal!
Sujeitar os juízes (e os Tribunais) a uma dependência governamental, tratando-os como meros funcionários públicos subalternos do Governo, seria decretar a agonia do estado de Direito, asfixiar a Democracia, aquela menina que tantos bajulam, mas que não se preocupam em salvar quando ela já vai esbracejando na tentativa de evitar o afogamento!

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Fora de órbita!

Acabei o último apontamento às voltas com Saramago e a "sua" União Ibérica!
Escrevi sobre os símbolos pátrios que, por o serem, merecem atenção e respeito. Sem dispensáveis fanatismos, mas com honra e, sobretudo, sem vergonha ou inculcados temores!
Respeitá-los é respeitarmo-nos enquanto concidadãos.
Reconheci sempre, sem rebuços, o valor dos intelectuais deste País, na seu exercício de vida de sublimação da mente, na inquietação da luta pelo pensar mais além.
O que não impede que questione, muitas vezes, e não concorde outras tantas, com alguns dos seus assomos, tantas vezes, estapafúrdios! Comparo-os, então, com as naves espaciais quando vão além da órbita da Terra: nunca sabemos o que vão encontrar.....o que dali vai sair!
Foi, mais recentemente, o Saramago, já havia sido Alçada Baptista, em 1997.
E o que, no ensejo, escrevi, já lá vão dez anos, tem plena actualidade. Há valores que são imutáveis e não se esboroam com o inexorável passar dos anos:

Ainda se não desvaneceram os ecos do inesperado brado do intelectual Alçada Baptista.
O pouco que ficou foi a estupefacção de muito boa gente, ao ouvir dum homem de reconhecida cultura, uma das estrelas cintilantes do nosso espectro intelectual, numa cerimónia em que era suposto serem exaltados os símbolos e valores da Nação, proposta tão desajustada!
É verdade que as opiniões pessoais só vinculam quem as defenda e salutar é que se respeite esse direito. Mas, perante uma afirmação daquele jaez, proferida em cerimónia oficial, quem pode ficar imune à crítica?
Vou recuar no tempo e passar, directamente, à "questão do Hino", procurar beber um pouco da sua história.
A marcha guerreira que, só após a tomada do Poder pelos republicanos, em 1910, veio a ser adoptada como Hino Nacional, foi composta por Alfredo Keil e Lopes de Mendonça, após o Ultimato Inglês de 1890.
Sabemos do aproveitamento político que os adversários da Monarquia fizeram deste evento: a marcha soava bem, ficava no ouvido, inspirava coragem revolucionária.
Natural foi que o público das revistas (teatro) - então muito em voga - saísse para a rua a cantá-la, após ouvirem os seus acordes no Teatro da Alegria.
Foi tal a colagem desta marcha aos ideais republicanos de então que veio a ser proibida pelo poder monárquico, em 1891.
Vir, agora, um nobel herdeiro dos pais da 1ª República, anti-monárquicos convictos, censurar a marcha que os seus ideólogos predecessores adoptaram como Hino Nacional logo após o triunfo republicano é, no mínimo, desconcertante.
Não creio que um monárquico, por mais fiel que seja à Causa, tivesse a torpe ousadia de o secundar!
Cabe aqui um parênteses: visto, com pragmatismo, mesmo a esta distância histórica, o Ultimato Inglês até nem foi tão nefasto para os nossos interesses coloniais de então, se atendermos ao contexto internacional, com muitos países ciosos das nossas possessões africanas.É que o tratado luso-britânico de 11/6/1891 confirmou a nossa soberania sobre extensos territórios que, reconheçamos, por falta de homens, meios e, talvez, vontade, não dominávamos antes. E esse ultimato acabou por ser a mola que fez despoletar o empenhamento pelo efectivo domínio desses territórios.
E volta a ser curioso como um facto histórico - o ultimato - que acirrou o ódio das massa contra a Monarquia, a quem acusaram de traição à Pátria, e foi o principal estandarte republicano de agitação popular, num pretenso assomo de portuguesismo colonialista, viesse a ser o embrião do Hino Nacional, hoje símbolo de respeito e união, quando sabemos terem sido os lídimos defensores dos homens da Maçonaria e da Carbonária de então, a apressarem-se, já nos nossos tempos, a defenderem com denodo e a provocarem, com pressa e grosseira precipitação, sem honra, sem glória e sem futuro para os Povos colonizados, a entrega desses territórios, os tais que se integravam no tão badalado Mapa-Cor-de-Rosa!

Mais valeria que os primeiros o tivessem feito então e antecipassem, em quase um século, o abraço à Europa que nos estava a ficar tão longe. Além do mais, teriam poupado muito sangue, traumas, suor e lágrimas, a milhares de heróis do mar!...
Com este pressuposto, sim, Lopes de Mendonça teria escrito outra letra para a marcha que Alfredo Keil compôs para fim de acto da revista política "Torpeza", em cena no Teatro da Alegria, já lá vão mais de cem anos.
Mas, é evidente, sem qualquer ironia, nenhuma destas constatações dá legitimidade, de qualquer natureza, a quem quer que seja, para alterar um facto histórico.
Não aceito, ninguém de boa fé o fará, que, ao sabor dos tempos e das marés, se vão substituindo (ou decapitando) estátuas, nomes de ruas, de monumentos, de obras de arte. Os factos históricos, positivos ou negativos, consoante a perspectiva de cada um ou de cada grupo, aconteceram na realidade, são marcas indeléveis no imaginário colectivo de cada nação e deles há ilações a tirar.
E é com factos históricos - positivos ou negativos -, que os membros duma Sociedade melhor se esclarecem para as grandes opções do futuro, enquanto interventores nos processos evolutivos.
Alterar ou suprimir o Hino Nacional só porque ele faz apelo "às armas" em tempo de paz, como pretendia Alçada Baptista, mais do que um acto gratuito, seria uma afronta à História.
Mas, ainda que se aceitassem os argumentos, supostamente, pacifistas do proponente, quem recusará reconhecer que necessitamos de armas, muitas armas, que não as da guerra, mas as económicas, de trabalho, de saber, com perseverança marcharmos contra os "canhões" que são os escolhos, os obstáculos, as lutas económicas, que se nos vão deparando na Europa do nosso destino?! Não é demagogia, é um desafio bem real e actual.
É que Alçada Baptista, de quem não descremos do elevado grau de cultura e iluminismo, não se compadecendo com imagens literárias ou não não reconhecendo que somos um povo de poetas, estava a condenar Camões no próprio dia em que lhe foi cometida a missão de o celebrar: o gigante Adamastor seria mesmo, e só, um monstro horrendo que devorava as nossas caravelas? O Velho do Restelo seria apenas, singularmente, aquele velhote rabugento que se postava no areal a praguejar contra a partida das nossas naus?
Nada disso, como é óbvio. Alçada Baptista deve ser um homem inteligente, que conhece o valor dos símbolos e das imagens. Pretendeu, com a sua proposta, uma centelha de luz dos projectores televisivos que lhe iluminem o crepúsculo de homem público?! Talvez.....
Por mim, mantenho que continuo a sentir-me bem ao ler, ouvir ou cantar toda a letra do nosso Hino e não me envergonho do orgulho que sinto quando onze jovens de equipamento verde-rubro o fazem em uníssono nos campos de futebol, ou quando a pequena Rosa Mota, a nortenha Fernanda Ribeiro, a morena Carla Sacramento, o entoam, com sentidas lágrimas nos olhos, enquanto desfraldam e acenam com a bandeira que sentem sua e de todos nós.
Bandeira que, mais do que o Hino, reúne em si séculos de história, pois se o esperançoso verde e o revolucionário vermelho lhe foram atribuídos pelos republicanos, os brasões, os castelos e a esfera armilar em muito os antecederam.
E, já agora, correndo o risco de a muitos ter de pedir perdão, aventuro afirmar que mais de 90% dos portugueses com menos de trinta anos não faz uma leitura plena dos símbolos da sua e nossa Bandeira.
Não os culpemos. Julguemos antes os complexos que se criaram quanto ao ensino da História nos bancos das nossas escolas. Gerou-se um sentimento de pavor em transmitir os eventos verdadeiros, as fases de glória e crise da Nação, e de tal forma que, tempo houve, em que soava a pecadilho político falar em Pátria!
Como se alguém tivesse medo da verdade histórica!
Certo é que as matérias de várias disciplinas foram bruscamente alteradas, mesmo a nível universal, pelos acontecimentos que foram ocorrendo de forma célere por todo o Mundo, mas não creio que fosse só essa a razão de tanto trabalho dado aos tipógrafos.
É que os "fazedores" de história do nosso país, nos primeiros anos pós-revolucionários, faltaram ao rigor, opinaram de mais e viram-se aflitos quando tiveram de informar e corrigir que, afinal, as maravilhas económicas do Leste, do Sol da Terra, por exemplo, tão profusa e apaixonadamente apregoadas nos compêndios, não passaram duma miragem, dum logro narrativo.
Nesse período, estudou-se mais a história de certos países predilectos, por conveniência revolucionária, que a de Portugal.
E os tristes resultados vêm depois.....alguns anos depois.

É certo, e justo reconhecê-lo, que antes da Revolução de Abril de 1975, mais do que o rigor histórico, o método de os transmitir deixava muito: era o culto da personalidade, em que, passe o exagero, era primordial saber da cor dos olhos duma Infanta ou se este ou aquele rei era bígamo ou beato, do que conhecer o cerne dos acontecimentos e dos ciclos evolutivos. Mas o estudo da História Pátria era exaustivo e, arrisco mesmo, comparativamente, menos tendencioso.

Ter-se medo que o Povo conheça profundamente a sua História, é temer a verdade. Quem teme a Verdade?



sábado, 10 de novembro de 2007

De Espanha....

Eu sei, pelas décadas já vividas, e muitos anos atentos, que só o simples facto de ilustrar o texto com esta primeira imagem poderá provocar comichosa sarna politica nalguns leitores que por aqui passem o olhar curioso.
O simples evocar dum símbolo pátrio, despoleta essa, nem sempre sentida, raiva em mentes com esquerdistas complexos, em ex-fascistas convertidos, há trinta anos, em revolucionários sanhudos e em ressabiados apátridas.
Surpreendido fiquei ao não ouvir o eco dessas serôdias reacções quando os "Lobos" cantaram com garbo, e de garganta viva, o nosso Hino!
Não invento, ao afirmar que muitos dos intelectualóides que pululam por essa Esquerda rançosa não deixaram de os conotar com exacerbados nacionalistas ou perigosos atletas de Extrema Direita.
Qualquer incauto português que exalte os valores pátrios ou exorte os seus símbolos, sujeita-se a esse vulgar labéu!Aplicada que está a vacina contra esse surto epidémico, mas da moda, passo ao que ora interessa.


Já por aqui fui vertendo a opinião de que o nosso destino europeu é inevitável e não há mesmo como retroceder. Entrámos num barco sem retorno e nem o risco corremos de sermos atirados borda fora.
Estamos de corpo todo na grande sociedade europeia e cumpre-nos acompanhar e participar na marcha do grupo.
Isso implica, como é inexorável e de honra, que, enquanto membro, de plenos direitos e deveres, da União Europeia tenhamos que cumprir as normas decididas e aprovadas pelo conjunto das nações que a integram, nos planos político, económico e social.
Mas, também, sabemos que numa União de Estados, todos estamos subordinados ao "todo" e a nenhum Estado em especial, subalternizado por qualquer dos membros que a integram.
E é neste pormenor, ou nem tanto, que a nossa ancestral subserviência me parece vir aflorando, remetendo-nos ao velhinho trauma de menoridade.
Menoridade ou outros obscuros interesses grupais que, por decisões, ou indecisões, ao mais alto nível dos políticos, vão permitindo que os nossos vizinhos espanhóis se arroguem do, não menos antigo, tique de paternalistas.
E, os que têm estado atentos não deixarão de perceber que os interesses políticos, económicos e, até, territoriais de Espanha, se estão a sobrepor aos desígnios do nosso País.
São as grandes empresas espanholas, com os centros de decisão para lá da fronteira, a controlarem a nossa actividade produtiva, com domínio substancial na área da Indústria, na área do Comércio e, até, na área do fabrico e comércio de explosivos civis. O que, como é óbvio, só será possível com a conivência de grandes "vultos" da nossa Praça!

E, parece já estar em marcha, a fase de apropriação de território, quando nos é dado conhecer que instituições bancárias, de capitais públicos espanhóis, acenam aos "nuestros hermanos" com empréstimos de juros baixos, simbólicos, desde que o capital seja aplicado na compra de herdades no Alentejo ou terrenos da serra algarvia!

A pressão é ora mais avassaladora e não lhes estará a faltar o apoio e incentivo por parte dos nossos timoneiros. Como se o almejado controlo ainda não era total, o factor IVA vem-se encarregando do resto: as zonas raianas de Portugal, de há anos a esta parte, estão, economicamente, à mercê de Espanha. É lá que engordam a bolsa dos nossos vizinhos, na aquisição de produtos que, deliberadamente ou não, o nosso IVA encarece!

Diria que esta realidade até nem seria trágica se viesse a ser a saída da míngua a que o Povo Português vai sendo votado, mas sabemos que o não é nem será. Quanto muito, será um chorudo amealhar de capitais para meia dúzia de judas portugueses "espertalhões" que de tudo isto beneficiam com o bolo da traição.

Delirante a perspectiva a que acabei de tentar dar expressão? Será.....mas não mais que a aventada por um dos, no início do texto, aludidos intelectuais, o Nobel Saramago!

Alguma atenção e o futuro próximo se encarregarão de aclarar este meu ponto de vista. E, espero bem, ter lido mal os sinais!...






quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Cumpre-se o fado......


Eu já pressentia que iríamos ter mais do mesmo no debate do Orçamento para 2008.
Aquela "gente" não tem remédio, não sabe arrepiar caminho.
E nem me dou ao trabalho de fazer novo esforço de escrita para expressar a imagem que, em síntese, me ficou de mais uma discussão acerca da forma de se desbaratar o bolo do esforço que nos vai sendo pedido, nos sucessivos assaltos aos bolsos dos portugueses. Limito-me a recordar o que por aqui escrevi, no passado dia 1 deste mês, que deveria ser de Outono, mas teima em continuar de Verão quente:


"Numa retrospectiva breve, é fácil assumirmos que, mais do que governarem bem, as preocupações primeiras dos executivos, dos vários quadrantes, sem excepção, tem sido o, já mórbido, descartar o insucesso dos seus exercícios nos que antes passaram por São Bento.Já provoca náuseas, por tão repetitivo este estratagema! E não devia ser assim! É uma regra miserável que só convence os incautos, os cidadãos menos avisados, que vão sendo administrados por forças partidárias de compadrios e caça-votos, na egoísta procura da satisfação das suas clientelas.Não se pede que os sucessivos governos, os de ontem, de hoje e de amanhã, percam tempo com inócuos elogios aos que os antecederam, ou que se sintam, estrategicamente, obrigados a reconhecer-lhes os méritos como ora fez a Ministra da Educação. Pede-se, sim, é que governem bem e que, no fim de cada legislatura, nos apresentem resultados palpáveis e o rumo certo para um País que tem sido farto pasto da voracidade de grupos e lobbies. E que, sobretudo, não justifiquem os seus continuados falhanços com os hipotéticos erros de executivos passados, não poucas vezes, chegando ao ridículo de se desculparem com o negro fado dos tempos do homem de Santa Comba!"


Servindo-me das próprias palavras dos nossos "ilustres" parlamentares, ESTAMOS CONVERSADOS!

terça-feira, 6 de novembro de 2007

O confronto

O debate na AR do Orçamento de Estado para 2008 inicia-se hoje.
Para a maioria dos órgãos de comunicação social, nem é tanto a substância em discussão que, parece, importar. É-lhes, na óptica dos seus interesses, mais apetecível o enfoque na confronto Sócrates versus Santana!
Criam, perante os consumidores do mediático, o clima que antecede um clássico futebolístico, tipo Benfica-Sporting.
Quem ganha? Quem perde?
É o grande desafio nacional que jornais, rádios e televisões valorizam, como se as questões que importam ao comum do cidadão fosse saber qual dos garnisés vai ganhar a luta da capoeira!
Depois, como sempre se viu, mais do que nos darem a conhecer daquilo que realmente nos importa da discussão da matéria em debate, iremos ler e ouvir: Ganhou o Sócrates! Ganhou o Santana! Empataram!

E nós, cidadãos pagantes deste e doutros espectáculos, ficamos esclarecidos duma certeza, dum resultado imutável: Vamos continuar a PERDER!

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

DREN desafinada


Ainda não esquecemos o caso do Professor Charrua protagonizado pela responsável da DREN (Direcção Regional de Educação do Norte), Margarida Moreira.
Recordemo-nos que, o tão conhecido "delito de opinião" foi de imediato sancionado por aquela Directora que, brandindo a espada da rosa, castigou, de imediato, o laranja Fernando Charrua com pena de suspensão, sem, no mínimo aguardar pela decisão dos tribunais, a quem fez conhecer do processo, por intermédio do Ministério Público.
Também nos lembramos que, numa reunião com o Presidente da Câmara de Vieira do Minho, o Padre Albino Carneiro, também ele laranja, mais uma vez aquela senhora brandiu a sua espada rosa, aconselhando o autarca a ir "rezar missas".
Fosse pelo reconhecimento dos seus méritos, fosse pela destreza manejar a tal espada rosa, o facto é que esta senhora foi reconduzida no cargo. E lá está, poderosa e soberana!
Chegam-nos, agora, noticias dos abusos de um professor de Música duma das escolas tuteladas pela mesma Directora da DREN, Margarida Moreira. Segundo elas, aquele docente, ia acenando com facilidades nos testes do Dó, Ré, Mi a troco de favores sexuais das suas alunas menores.
Tal como no caso Charrua, o processo corre os seus trâmites nos tribunais.
Mas, e é aqui que radica a minha estupefacção pela flagrante dualidade de critérios, o homem da batuta continua, a dar as suas aulas solfejo a alunos menores, enquanto aguarda pelo julgamento.Escuda-se a mesma Directora da DREN no facto do Juiz de Instrução não haver decidido pela sua suspensão, limitando-se a proibi-lo de contactar as menores objecto dos seus desafinados acordes....
O que não colhe. Ela mesma não esperou por qualquer decisão judicial para suspender o Professor Charrua. E, tenho para mim, que nem há comparação possível entre os delitos de que foram acusados. Se é que o primeiro cometeu algum delito ao manifestar o seu descontentamento pela forma desastrada como este país está a ser governado! Por fazer uso dum direito consagrado em democracia!....
Os casos que venho aflorando e outros que se foram conhecendo e em que aquela senhora deixou bem evidente a partidarização das suas medidas persecutórias, dão-me o direito, e a preocupação, de pensar que estamos a voltar aos tempos das perseguições políticas. Melhor esclarecido ficarei, quando souber da filiação partidária do "sortudo" Professor de Música...
Não que pretenda condenar a Rosa e proteger a Laranja. Não caio nessa esparrela mental: os denunciados de hoje, até poderão vir a ser os acusadores de amanhã.
O que me perturba é esta comichenta sensação de estar, de novo,na eminência de viver tempos de despotismo, arrogância e injustiça e em que se protegem os poderosos e apaniguados, enquanto se perseguem os que o não são.
E, já agora, porque nestas minha divagações os "abusos sexuais" vieram de novo à berlinda, quando poderemos saber dos autores daquela estranha alteração a um preceito do Código Penal que consagrou o "crime continuado", permitindo que esses predadores possam ser punidos por um só crime, mesmo que hajam abusado n vezes da sua vítima?!
Urge essa transparência. Doa a quem doer. Que um Poder de sombras, nunca será farol para um Povo que quer luz!

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Crime...digo eu!




Sei que os alarmismos exagerados não são benéficos, nem contribuem para um clima de segurança a que a esmagadora maioria aspira e a que tem direito. Mas assobiar para o lado como nada esteja a acontecer neste país tradicionalmente pacífico, nada resolve ou tranquiliza.
Darem-nos a conhecer estatísticas, tentarem-nos convencer de que os índices da criminalidade estão em rota descendente, mais não podem ser que paliativos reconfortantes, informados que vamos sendo de tudo o que se vai passando por este país fora. Nos grandes centros, mas também, e a um ritmo inusitado, nas cidades, vilas e aldeias do interior.
O que não surpreende. Sabemos, por experiência de vida, que a criminalidade, a violência, aumenta à mesma velocidade em que o custo de vida aumenta e a economia das famílias se degrada.
E este ciclo que atravessamos é, para a grande massa de portugueses, de dificuldades económicas e consequente degradação social, acrescidas!
Sendo certo que não conhecendo daqueles crimes "de colarinho branco", os nebulosos meandros de compadrios e corrupções de grupos e elites instaladas, aconchegados na teia intocável de proteccionismos, sabemos todos dos sucessivos assaltos a multibancos, ourivesarias, viaturas, pessoas, com recurso a violência, alguns com trágicos desfechos e vítimas. Estes, não há como encobri-los do temeroso cidadão: a máquina mediática serve-os às bandejas, todos os santos dias desta terra...
Nada que os responsáveis deste país não saibam e, pressinto, não esperassem, ao enveredarem por esta exacerbada política economicista, sem preocupações sociais.
E se o encerramento de centenas de postos policiais por todo o Portugal e a permissividade de algumas leis recentes (drástica redução das prisões preventivas, seringas nas prisões...) têm essas preocupações economicistas, poderão, por outro lado, ser um sinal claro de que têm o convencimento de que as condições económicas e sociais das pessoas irá em breve melhorar, sei lá se pensando nos dinheiros que estão a chegar e com as grandes obras que estão a programar!...
Continuaremos a esperar.....para ver!
Hoje, há lugares, há bairros estigmatizados por serem os alfobres e abrigo de gangs violentos. É a Cova da Moura, é o Bairro da Bela Vista, é o de Chelas, o do Cerco...e tantos mais. Sem descrer que, pelo que se vai lendo e sabendo, radicarem nos bairros onde o trabalho social do Estado fracassou, não creio que a origem e os focos da criminalidade grupal esteja tão localizada. Por força das condições que dão origem a esses comportamentos desviantes e que já acima apontei. A degradação económica e social reinante está a dispersar-se geograficamente, a mancha alastrou!
Ainda que essas motivações estivessem presentes, bem diferentes seriam as caricaturas, as marcas psicológicas, de muitos dos que, nos idos anos oitenta, se dedicavam ao banditismo armado. Por esses anos, tive essa percepção, era mais a necessidade de fundos para sustentação do vício "maldito", e era mais o ínvio caminho da aventura, tipo desporto radical em gestação, que levava muitos dos jovens a enveredarem pelas perigosas veredas do crime.
É uma imagem de outros tempos que retrato em mais um conto (inspirado em factos reais) que me saiu das teclas há quase duas décadas:
O Toninho da Taiti
Era o Verão de 1967.
Na Avenida de Roma, ao cair quente da tarde, grupos de senhoras, deliciadas nos chilreios pardalescos do parque arborizado, em passada pendular, gastavam os minutos que faltavam para o capricho social do chá-convívio no Salão da zona.
Perto delas, pontapeando vazios cartuchos de pipocas, a criançada acompanhava-as, em jovem alarido.
Não era inédito este quadro no bairro citadino da fadista Lisboa. E até os velhotes, que se espalhavam, sisudos e alquebrados, pelos bancos da avenida, como parte integrante da paisagem, se tinham habituado ao movimento rotineiro daqueles alegres grupos de vizinhos, mais jovens, nas imediações chiques da afamada pastelaria.
Lá ia a D. Cacilda, esposa do terceiro oficial da Conservatória, a D. Jacinta, do Liceu, a D. Amélia, algarvia, e os petizes; toda aquela gente que dava um pouco mais de vida aos olhos já tão vividos dos idosos reformados.
Os maridos, alfacinhas de gema, passariam mais tarde: o Eusébio estava em forma e os Estádios da Luz e Alvalade, ali bem perto, arrebatavam-nos às esposas, naquelas tardes soalheiras.
Entretanto, mais um chá, mais umas torradas - para as senhoras; os filhos, esses preferiam um sorvete fresquinho, enquanto se divertiam, alheios às conversas adultas das mamãs.
- O meu menino....reparem como é vivaço, o meu Toninho! - e a mamã, uma senhora de jeito desinibido, apontava com a última crónica feminina, que apertava entre os dedos bem tratados, um moço dos seus cinco anos, que cabriolava por entre as cadeiras do "TAITI".
- Lá isso é, menina Amélia, o miúdo tem ares de vir a ser um valente rapagão! E a habilidade com que segura a espingarda!...
O Toninho, de pernas arqueadas, em cima da cadeira, por debaixo do televisor, fazia pontaria para os amiguinhos que, colaborantes, simulavam abrigar-se por entre a clientela indiferente.
- Dá-lhe um tiro, mata-o, Toninho! - E o catraio, de peito eriçado na camisa de ganga azul, com os braços espinafrados, à Popeye e fazendo piscas com os olhitos brilhantes junto à coronha plástica da sua última prenda, lá ia disparando rajadas de intenções: tau.....tau.....tau....
D. Amélia, de olhar comovidamente vaidoso, com a mão no braço nu da D. Cacilda, informava a assembleia do chá que era a quarta arma oferecida pelo Alfredo, seu extremoso marido, ao lindo menino.
- Ele agora, vejam lá, não deixa o pai em paz enquanto lhe não comprar uma metralhadora, ou lá o que é, que viu há dias numa montra do Chiado! Não quer outros brinquedos, o diabo do rapaz!....
- Há-de ser um grande homem, menina Amélia!
- Se há-de, menina Jacinta, um grande homem!
- Um grande homem! - exclamou, em uníssono, o embevecido coro.

E os anos foram passando, gastando-se lentamente pelas serras, pelos vales e, também, naquela avenida de betão alfacinha.
Os velhotes do parque eram já outros: em cada Outono que surgia, o vento levava, por entre as folhas secas, mais uma das figuras do grupo crepuscular.
Outras amigas, mais novas, foram engrossando o caudal daquelas damas que desaguava, quase sempre, nas vistosas arcadas do "Taiti".
Mais meninos, outros meninos, continuavam a ser as fiéis sombras das mamãs nos Domingos de chá.
Os de outrora, já com pêlo na venta crescido, haviam-se libertado das asas galináceas das maezinhas.
Os maridos, aqueles, continuavam no cumprimento do seu "sagrado" dever. O Carlos Manuel até estava a fazer umas jogatanas!....
Era o Inverno de 1985. Foi numa fria manhã, mas sem chuva, que as sirenes irritantes de ambulâncias e Policia, agitaram as ruas da cidade. O Saldanha era um mar de gente buliçosa, que se apinhava à porta do Banco.
Pouco antes, um grupo de quatro embuçados, empunhando pistolas metralhadoras dos últimos modelos, haviam feito um "raid" ao Espírito Santo. O assalto, que em parte fora bem sucedido, apesar do roubo se cifrar em poucas centenas de contos, teve o negro saldo de duas vítimas roubadas à vida. Uma foi o caixa, que se recusara a satisfazer as exigências dos assaltantes. A outra foi o marginal que sobre ele disparara, duas vezes, sem piedade. A Policia, que entretanto acorrera, surpreendeu-o a sair do Banco, quando os comparsas se haviam já posto em fuga, recreando-se com mais uns tiros para a montra largo do estabelecimento.
Era um rapaz dos seus vinte e poucos anos, de forte compleição física, botas de tacão alto, com o cabelo negro caído, em desalinho, por sobre o pescoço ensanguentado. Era um desconhecido. Caíra, sob as balas dos agentes da ordem, na borda da sarjeta.
Quem seria?
Horas passadas, os investigadores apenas sabiam que a pesada pulseira de prata que trazia no pulso direito, tinha inscrito o nome "ANTÓNIO". No reverso, lia-se a dedicatória "MÃE AMÉLIA".
O corpo gelado do "pistoleiro" aguardava num dos bocados de frio mármore da Medicina Legal. Quem o iria reconhecer?
Noite alta, depois de várias centenas de pessoas terem desfilado pelo lúgubre corredor, chegou a vez de tão respeitáveis senhoras passarem os olhos curiosos pelos rostos do "ANTÓNIO". E foi reconhecido!
- É o meu Toninho! Que desgraça, meu Deus! Quem matou o meu rico filho?
- Menina Amélia, será possível? O Toninho um assaltante, um assassino? Que desgraça!.... e a trémula Cacilda recolheu nos braços o rosto amargurado da sua amiga.
- Cacilda - sussurrou em voz tíbia aquela sofrida senhora - o meu filho....que eu tão bem eduquei, a quem nunca recusei nada, a quem dava tudo, tudo o que me pedia, o meu filho....que podia ser um Homem!...
- Podia ser um Homem! - murmuravam chorosas as três senhoras, unidas naquela imensa dor.
Podia ser um Homem, o Toninho!



quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Espanto!

A actual Ministra da Educação, em declarações públicas, reconheceu resultados positivos alcançados desde 2004 mercê do aumento de cursos profissionais e da Reforma do Ensino empreendida por David Justino.
O que me espanta nem é tanto a eventual virtualidade das medidas do antigo ministro. Espanta-me, sim, é o facto duma ministra dum governo socialista vir a terreiro tecer loas ao desempenho dum seu antecessor doutro espectro político!
Espanta-me, sobretudo, pelo ineditismo do acto.
Num país em que, após a revolução, vamos assistindo, ciclicamente, os detentores do Poder alijarem a responsabilidade da falácia da sua governação nas medidas tomadas, nos diversos campos, pelos que os antecederam nos centros de decisão, as declarações da senhora ministra só podem mesmo causar espanto.
Numa retrospectiva breve, é fácil assumirmos que, mais do que governarem bem, as preocupações primeiras dos executivos, dos vários quadrantes, sem excepção, tem sido o, já mórbido, descartar o insucesso dos seus exercícios nos que antes passaram por São Bento.
Já provoca náuseas, por tão repetitivo este estratagema! E não devia ser assim! É uma regra miserável que só convence os incautos, os cidadãos menos avisados, que vão sendo administrados por forças partidárias de compadrios e caça-votos, na egoísta procura da satisfação das suas clientelas.
Não se pede que os sucessivos governos, os de ontem, de hoje e de amanhã, percam tempo com inócuos elogios aos que os antecederam, ou que se sintam, estrategicamente, obrigados a reconhecer-lhes os méritos como ora fez a Ministra da Educação. Pede-se, sim, é que governem bem e que, no fim de cada legislatura, nos apresentem resultados palpáveis e o rumo certo para um País que tem sido farto pasto da voracidade de grupos e lobbies. E que, sobretudo, não justifiquem os seus continuados falhanços com os hipotéticos erros de executivos passados, não poucas vezes, chegando ao ridículo de se desculparem com o negro fado dos tempos do homem de Santa Comba!
Só assim a classe política recuperará alguma credibilidade. Só assim um Povo pode confiar e votar, com alguma tranquilidade e sem a desconfiança generalizada, nos timoneiros que se vão perfilando, e falhando, na missão de levarem a bom porto esta velha barca que vai submergindo a custo, de naufrágio em naufrágio!
Mais do que partidos e de políticos comprometidos com clientelas, o que esperamos é gente capaz, competente e honesta, que saiba servir e não servir-se!